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domingo, 2 de janeiro de 2011

Lutos e perdas na cartilha da vida

“Tudo neste mundo tem o seu tempo, cada coisa tem a sua ocasião...” (Ec. 3,1).               

Lutos e perdas - Serão lutos e perdas os aprendizados mais difíceis da vida? Estaremos aptos para o sofrimento, algum dia? Segundo D’Assunção, a morte é, sem dúvida, nossa maior “perda”, pois não a entendemos como uma “transformação”!

A passagem bíblica “Tempo para tudo” sugere-nos o caminho ascético (espiritual), o amadurecimento dinâmico frente aos ciclos vitais que sinalizam ganhos e perdas na cartilha da vida. “Tempo para nascer, tempo para morrer. Tempo para plantar, tempo para colher. Tempo para chorar, tempo para dançar. Tempo de ficar triste e tempo de se alegrar. Tempo de paz e tempo de guerra. Tempo de abraçar e tempo de afastar. Tempo de procurar e tempo de perder. Tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las.Tempo de rasgar e tempo de remendar. Tempo de calar e tempo de falar.” (Ec.3,1-8)

Cabe a cada um identificar o seu ciclo vital e elaborar lutos, perdas e ganhos.
A perda poderá gerar sentimentos de culpa, raiva, ansiedade e até depressão.
Lutos e perdas oportunizam mudanças internas e externas e modificam a vida de quem perdeu e de quem partiu. Ao invés de negar as perdas, organize o luto com o coração, a mente e a vontade. Perguntar-se qual o aprendizado desta lição na vida, atribuindo-lhe resposta de “significância maior”, além do que se vê, se ouve, se sente e se compreende. Com fé libertar-se do banco da lamentação. Crer que subjacente a perda-morte há o mistério nascimento-vida. A vida é ritmada na cadência nascer, morrer, ganhar, perder, fazer, ser. Cantar, dançar, chorar são capítulos da cartilha da vida. No nascimento perde-se a morada no seio materno, corta-se o cordão. Separamo-nos.

O choro do nascimento é o grito doído do pulmão aprendendo a respirar sozinho. Ganho escondido na intimidade da perda. Ganhos e perdas entrelaçam-se.

O sol perde o dia enquanto a lua ganha a noite. Eis o princípio da realidade.

Aceitar o luto - Disse-me doloridamente a mãe, cuja filha doente morreu há um mês, deixando-lhe dois netos adolescentes órfãos (11 e 15 anos): ‘’Preciso deixar a minha filha partir, descansar...”

A mãe sofrida, sentia saudades, tristeza. Chorava. Rezava pela filha (37 anos), dando-se conta de que ela concluíra seu ciclo terreno. Já não voltaria para o café da tarde. Seu cotidiano jamais existiria. Seu sorriso, porém, manter-se-ia no porta retrato e na memória afetiva familiar. A sonoridade de sua voz, suas alegres risadas, ecoavam no coração auditivo dos filhos. As mãos da mãe que afagavam a filha ainda traziam impresso o sofrimento da dor física desta. E neste luto avó e netos vão compondo a nova realidade. Escrevem e registram com palavras de dor-amor na cartilha da vida a aceitação e o encerramento desta história.

A aceitação das perdas é etapa determinante na elaboração do luto como realidade.

Falar e chorar o luto - Conta-me a senhora viúva: “Não quero chorar as saudades, nem falar da falta que meu marido me faz. Meus filhos não suportam ver-me triste e chorando.”

Por que esconder as lágrimas que choram a perda? Elas banham o rosto lavando a tristeza do coração. Por que negar a fragilidade humana? É ela que nos faz reconhecer a própria fortaleza, virtude concedida pelo Pai.

Eis um aprendizado: permitir-se colo, apoio, aceitando um lenço amigo que seque as lágrimas. Revestir-se da modéstia, da singeleza do deixar-se cuidar.

Cuidar da vida também é cuidar do sofrimento, da vulnerabilidade, das perdas e lutos.

Autorizar-se falar do vazio, da saudade de quem partiu é um jeito de conscientizar-se de que a pessoa amada encontra-se além do aqui e agora. Falar da dor ameniza machucaduras. Falar é liberar, é sarar, e aos pouquinhos a paz, a mansidão e a paciência farão moradas em sua cela interior. A paciência faz-se mãe da dor.

Partilhar sentimentos de perdas, choros, tristezas, tornar-se-á um percurso terapêutico na cura da dor e reorganiza a vida após o luto

Apesar da perda da pessoa amada, permanecem lembranças no espaço da casa, nos momentos comemorativos tais como aniversários, Natal, ano novo, Páscoa... Aos pouquinhos vai reorganizando o vazio de seu espaço interior e exterior. Na memória emocional e espiritual permanecerão as lembranças de quem partiu. Seja forte e veja a necessidade de fazer remanejos e adequações na sua casa. Com carinho e cuidado repense sua forma de viver e seus projetos de vida. Aceite, partilhe, cuide-se! A sabedoria do tempo estabilizará sentimentos e escolhas. Com benevolência e bondade entregue ao Pai quem partiu.

Viver aqui é transitório - Li algo comparando o tempo de vida com o tempo do piscar dos olhos. Anos vividos, segundos somente.

Viver é conviver com a irmã morte.

CREMA observa: a humanidade perdeu a dimensão do paraíso, da eternidade. Nega aos filhos o direito a frustração. Apresenta-se-lhes um mundo maravilhoso, tipo o paraíso é aqui.Teme-se a fala do transitório, da eternidade. Resta-nos alfabetizar a alma da humanidade. Precisa-se aceitar a impermanência e a finitude aqui, acreditando na permanência e infinitude acolá.

Que a fé, o amor, a esperança, a alegria, a paz e a mansidão ancorem em você.

Redija, na cartilha da vida, o contínuo vai e vem.

Amém!

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